quinta-feira, 11 de abril de 2013

Eu, as sapotas e a Polícia Federal

 
 “A beleza agrada aos olhos,
mas é a doçura das ações que encanta a alma”   Voltaire

 Quanto mais viajo, maior é a minha consciência sobre o pouco que sei e conheço. Então seguir viajando se faz necessário.
Na feira de Tefé descobri a sapota, uma fruta saborosa com textura aveludada e macia, contrariando a aparência rústica da casca. Todas as vezes que comia sapota me deliciava com aquele gosto ainda novo para mim, e que tanto agraciava o meu paladar. Sabia que aquela era uma experiência Amazônica e, dificilmente, teria a chance de comer sapotas em São Paulo.
Ao chegar ao aeroporto de Tefé para embarcar para Manaus, no dia 29 de março de 2013, percebi que os agentes da Polícia Federal inspecionavam a bagagem dos passageiros antes do check-in.
Como eu já tinha viajado outras vezes para a Amazônia, tinha conhecimento sobre algumas restrições para transportar produtos da floresta e, por isso, não havia comprado frutas. Conversei brevemente com os agentes federais que estavam de plantão e mencionei o quanto eu lamentava não poder levar comigo algumas sapotas. Um dos agentes me disse que não havia nenhum impedimento a respeito e isso me surpreendeu.  O meu voo estava atrasado, mas ainda assim eu não teria como voltar para a feira de Tefé para comprar frutas.   
Passaram-se alguns minutos e vi que um dos agentes da Polícia Federal estava saindo do aeroporto e disse: “se encontrar sapotas no seu caminho, lembre-se de mim”. Ele apenas sorriu e foi embora.
A espera no aeroporto foi longa e fui me ajeitando como pude na minúscula sala de embarque. Coloquei no colo a minha mochila que serviu de mesa para o meu computador e escrevi durante muito tempo. Não havia nenhuma conexão de internet no aeroporto.
Escrever para mim é uma forma de reviver a viagem e aqueles dias que passei na Reserva Mamirauá tinham sido intensos. Escrevia muito concentrada quando notei um vulto na minha frente. Levantei os olhos da tela do computador e vi o agente federal com o braço estendido em minha direção. Na sua mão uma sacola verde de plástico guardava três sapotas. Demorei alguns segundos para  entender aquele gesto tão humano, delicado e de uma doçura infinita. Foi uma alegria inesperada que vou guardar para sempre na memória.
No aeroporto de Manaus procurei um oficial da Infraero para me certificar que poderia embarcar para São Paulo com as sapotas. Fui informada que não era permitido viajar com nenhuma fruta que tivesse semente, apenas polpa ou frutas processadas.
O que fazer?  
A única solução que me ocorreu foi comer as sapotas.
Fui até uma lanchonete do aeroporto e pedi uma faca emprestada. Contei o episódio das sapotas para a moça que me atendeu e dei uma para ela. Apesar de ser amazonense ela não conhecia sapota.
Sentada numa cadeira de alumínio sem muito conforto, tarde da noite, eu comia as minhas sapotas. As mãos lambuzadas cortavam desajeitadamente a fruta tão nobre. O pensamento fugiu do aeroporto e voltou para a floresta alagada, para os passeios de canoa que trouxeram a lembrança de todas as pessoas especiais que havia conhecido, suas casas, seu jeito de viver, a beleza de Mamirauá, os sabores da feira de Tefé, a atitude tão gentil do agente federal... 
Sabia que em algumas horas estaria de volta a selva de pedra da cidade grande... Chorei.

6 comentários:

  1. AUDY,

    DEMASIADAMENTE HUMANA......SIMPLESMENTE A MELHOR HISTÓRIA QUE EU JÁ LI EM SEU BLOG.

    BEIJOS E CUIDE-SE BEM!!!

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    1. Oi Ale,

      Eu não poderia deixar de compartilhar o que chamo de "episódio sapotas". Foi uma situação inusitada e muito especial para mim.
      Beijos,
      Audy

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  2. Adorei!!!! Bem que eu vi no seu primeiro blog desta viagem que estas sapotas iam render!!! Parabens por ser tão comunicativa amiga, isso definitivamente faz você viver momentos muito mais intensos, interagir mais e traz momentos inesquecíveis como este!! Bjos!

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    1. Olá Rê,

      Em qualquer situação eu procuro ver sempre primeiro a pessoa, o "ser humano em si" e depois o cargo que aquela pessoa ocupa. Talvez seja por isso que conversei com tanta naturalidade com o agente federal. Percebi uma certa indignação dele enquanto eu falava das sapotas do meu amor pela Amazônia...Acho que não deve ser uma conversa rotineira no trabalho dele no aeroporto. Enfim,qualquer que tenha sido o motivo vou sempre ser grata pela atitude dele.
      Beijos,
      Audy

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  3. Oi querida, vou postar aqui o que já disse no face: Quanta emoção não é minha amiga? Que gratidão por fazer parte do seu rol de amigos! Linda a sua história ou seria estória? Não importa. O que realmente importa é a delicadeza com que você vivência e compartilha-as conosco! Somos muito felizes por isso! Beijão e abraço apertado!

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    1. Oi Su,

      Muito obrigada pelo carinho. Acho que o belo tem que ser sempre compartilhado e, principalmente, inspirar outras pessoas agirem da mesma forma.
      A atitude do agente federal foi muito marcante para mim. Talvez ele não tenha ideia da importância e da grandiosidade do gesto dele, ou quem sabe este seja a seu jeito de agir. Simplesmente LINDO!
      Beijos minha amiga,
      Audy

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