domingo, 20 de março de 2011

O dia dos cancelamentos

(Texto escrito no Aeroporto de Dubai, 16 de março de 2011 e postado em Xangai)

Cheguei ao hotel bem feliz depois do passeio maravilhoso de balão. Fui descansar um pouco porque tinha dormido apenas duas horas na noite anterior e ainda não estava adaptada com o fuso horário de Dubai.
Antes de sair para o almoço  verifiquei os meus emails e, para a minha enorme tristeza, havia um email da Zouyan, a chinesa da CITS que estava organizando a minha viagem para o Tibete e Monte Everest, informando que o Tibete estaria fechado até junho de 2011 para estrangeiros. Isso significava que a minha viagem para o Himalaia estava cancelada porque a minha permissão de entrada havia sido negada.
Não consegui conter as lágrimas. Em segundos revivi todos os meses que passei organizando esta viagem, o sonho de visitar o teto do mundo, os inúmeros cuidados e planejamento para passar às 48 horas no trem a caminho de Lhasa, as trilhas pelo Himalaia, o encontro com o Monte Everest, os mosteiros, tudo, absolutamente tudo que eu havia tanto sonhado em conhecer não seria mais possível nesta viagem.
Eu tremia de angústia, incrédula diante do que estava lendo. A única coisa que consegui fazer foi encaminhar o email para a minha amiga Renata que iria me encontrar em Pequim em abril para irmos juntas para o Tibete e fui almoçar.
No restaurante a comida enroscava na garganta e não queria descer direito, os olhos marejados procuravam uma razão para entender o porquê daquela viagem que seria a mais fenomenal da minha vida estava se transformado na viagem dos cancelamentos e de uma enorme tristeza.
Enquanto  tentava me consolar e me recuperar do choque inicial, pensei que tudo aquilo era alheio a minha vontade e deveria ser grata por estar bem fisicamente, por não estar mudando os planos em função  algum problema físico comigo ou com a minha família.
Precisava cancelar todas as reservas e passagem para o Japão que eu deveria chegar  no dia 21 de março de 2011. A tragédia que assolou o país não me permitiria  ver suas flores e jardins e nem o Monte Fuji coberto de neve. Eu tinha planejado a data da minha chegada ao Japão minuciosamente para coincidir com a florada das cerejeiras em Tóquio e Kyoto.  Não dá para ariscar ir para o Japão agora que está terrivelmente arrasado após o terremoto. O pior é o risco eminente de uma catástrofe nuclear sem proporções.
Passei o resto da tarde fazendo todos os cancelamentos, era lamentável, mas não tinha outra opção senão cancelar tudo. A cada cancelamento que eu fazia relembrava de todas as horas que tinha passado pesquisando e estudando os melhores roteiros, os hotéis que eu havia escolhido em função dos bairros previamente estudados, o mapa do metrô das cidades que eu já havia parcialmente memorizado para me locomover livremente...  O coração estava partido e a mente bloqueada para a realidade. Fazia tudo mecanicamente.
Nesta mesma noite eu embarcaria  para Xangai. Decidi que iria procurar a loja da Emirates no Aeroporto de Dubai e mudar a data da minha passagem de volta para o Brasil. Anteciparia em 20 dias o meu retorno uma vez que a minha amiga Renata resolveu cancelar a vinda dela para a China porque nós já não  viajaríamos mais para o Tibete e para o Monte Everest.
No final da tarde o Henk me ligou para sairmos. Ele ouviu pacientemente todas as minhas lamentações e tentou em vão me animar. Fomos tomar um drink num bar de um hotel a beira bar. O lugar era muito lindo, mas eu tinha dificuldade até para desfrutar a sua beleza. O peito estava apertado e doía sem trégua.
Achei melhor ir cedo para o Aeroporto porque o meu visto de 96 horas nos Emirados Árabes ia expirar antes da meia noite e eu precisava passar pela imigração. Como tragédia pouca é bobagem só faltava eu ficar presa em Dubai para fechar o dia com chave de ouro cravada de diamantes e rubis!
O meu vôo para Xangai era às 3:50hs da manhã, ou seja, tempo mais do que suficiente para meditar, chorar, me acalmar e seguir em frente.       

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